Liderança feminina: mulheres representam mais de 70% do corpo diretivo da ESP/CE; índice não retrata realidade nacional

8 de março de 2022 - 10:48 # # # #

Texto: Elon Nepomuceno | Fotos: Deborah Muniz e Raiane Ferreira



Na ESP/CE há 8 anos, Geni Carmem já passou por diversos cargos de gestão na autarquia

Mesmo com mais anos de estudo e uma frequência mais ativa na escola, as mulheres ainda enfrentam barreiras para ocupar um lugar de destaque no universo corporativo. Segundo pesquisa do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), elas representam menos de 40% dos cargos de liderança País afora. Os rendimentos também não acompanham as atribuições e são 77,7% do salário dos homens, conforme o levantamento divulgado no ano passado.

A jornalista e pesquisadora do ativismo feminista em redes sociais, Marina Solon, destaca que, historicamente, os gêneros se estruturam de maneira onde às mulheres cabe o espaço privado e aos homens, o espaço público.

“Quando o capitalismo se constituiu, os homens saíam para trabalhar, e as mulheres ficavam ali, no espaço privado, exercendo as funções de cuidado. Era uma prática que servia de sustentáculo à atividade remunerada dos homensVale lembrar que, sem o trabalho ‘invisível’ e não recompensado das mulheres, o capitalismo nem existiria, porque o homem precisaria estar com a roupa lavada, a comida feita e os filhos sendo cuidados, para poder seguir sua jornada profissional. Então, a gente tem que entender que o espaço público não foi pensado, a priori, para as mulheres”, explicou Solon.

Diante deste cenário, buscar a equiparação de gêneros no corpo diretivo das organizações tem sido um desafio constante. Mas não impossível de superar. A especialista defende uma reformulação. “Colocar a mulher sempre em função do afazer doméstico vai impedi-la de estar nos espaços públicos. Com isso, é fundamental o preparo para que haja a agregação delas em outros ambientes. Por exemplo: uma empresa, quando vai contratar uma mulher, tem de, primeiro, não colocar empecilho para candidatas com filhos, mas adaptar-se, dar estrutura para que essa mãe tenha um suporte, uma rede de apoio. Já no cenário doméstico, é preciso repensar a distribuição de atividades, dividi-las entre homens e mulheres, a fim de prevenir uma sobrecarga, porque, enquanto elas se ocupam com essas coisas, os homens estão se capacitando, galgando novas posições nas empresas e as mulheres, historicamente, vão ficando para trás”, destacou a pesquisadora.

No Ceará, a gestão pública tem se mostrado atenta à causa e dado cada vez mais ênfase ao protagonismo feminino em sua estrutura. Na área da Saúde, vem da Escola de Saúde Pública Paulo Marcelo Martins Rodrigues (ESP/CE), vinculada à Secretaria da Saúde do Estado (Sesa), uma amostra da valorização delas em funções-chave. Mulheres são maioria no grupo gestor da entidade, comandando 73% das diretorias, gerências e assessorias da instituição. O índice segue a tendência do perfil geral dos colaboradores da autarquia: dos 300 trabalhadores, 184 são do gênero feminino.

Geni Carmem vivencia de perto esse movimento de consolidação da ESP/CE como organização que defende e amplia a participação feminina na tomada de decisões. Colaboradora desde 2014, ela já foi gerente de projetos, diretora de Educação Profissional em Saúde e, atualmente, exerce a função de assessora de Desenvolvimento Institucional.

“Fico feliz em trabalhar com outras mulheres e mais feliz ainda pela ESP ter o protagonismo feminino tão presente em sua gestão. Elas são empoderadas, com conhecimento, estão nesse lugar de destaque porque sabem o que fazer. É gratificante integrar essa equipe, enquanto mulher, e poder somar o meu conhecimento. A gente sabe toda a nossa luta para alcançar, de fato, melhorias e direitos ao longo dos anos. Não é fácil e há muito o que avançar ainda”, pontuou Carmem.


Alice Pequeno é diretora de Inovação e Tecnologias da ESP/CE

Instituída há cerca de um mês, a Diretoria de Inovação e Tecnologias (Ditec) também é um dos palcos da liderança feminina dentro da Escola. À frente do setor, está a doutora em Educação Alice Pequeno.

“É simbólico para uma mulher ser a diretora de Inovação e Tecnologias na ESP/CE, tendo em vista que esta é uma área demarcada fortemente pela desigualdade de gênero. Nesse sentido, eu considero que a criação é uma característica forte da mulher e, portanto, a diversidade das suas ideias, o seu potencial criativo e a sua capacidade de se articular em redes são características fundamentais para fortalecer e ampliar o ecossistema de inovação, em especial, naquilo que toca à Saúde”

Ainda na Saúde, o secretariado executivo da Sesa é composto totalmente por mulheres. Tânia Mara Silva e Coelho (Atenção à Saúde e Desenvolvimento Regional), Ricristhi Gonçalves de Aguiar Gomes (Vigilância e Regulação em Saúde), Lívia Maria Oliveira de Castro (Administrativa-Financeira), Luciene Alice da Silva (Políticas em Saúde) e Valéria Napoleão (Planejamento e Gestão Interna) compõe o quadro de gestão da pasta.

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Mais protagonismo feminino no Ceará

Em 2019, o Estado empossou a assessora fiscal jurídica, Fernanda Pacobahyba, como secretária da Fazenda. Foi a primeira mulher a assumir o cargo em 184 anos de história da Sefaz.

Outro importante capítulo da representatividade feminina no governo cearense foi escrito pela capitã da Polícia Militar, Lívia Galvão, que consagrou-se como a primeira mulher comandante de aeronave da Coordenadoria Integrada de Operações Aéreas (Ciopaer) da Secretaria da Segurança Pública e Defesa Social (SSPDS), em 2020.

Melhores líderes

Além de possuírem competências únicas, as mulheres se apresentam como melhores líderes durante as crises. A constatação encabeça um levantamento da Harvard Business Review. Conforme o estudo, durante a pandemia de covid-19, por exemplo, partiram delas os resultados mais positivos e as contribuições expressivas para o engajamento dos trabalhadores.

O estudo Mulheres São Melhores Líderes Durante a Crise, elaborado por Jack Zenger e Joseph Folkman, avaliou 454 homens e 366 mulheres no primeiro semestre de 2020. Os métodos utilizados foram extraídos do livro 360º do Líder Extraordinário, dos mesmos autores, e da avaliação de satisfação e comprometimento dos funcionários que trabalham diretamente com cada líder.

As mulheres pesquisadas foram classificadas de forma mais positiva em 68% das competências gerais de liderança. O público feminino se sobressaiu, principalmente, por causa do uso de habilidades interpessoais, como colaboração, trabalho em equipe e motivação, conforme as respostas dos entrevistados.